terça-feira, 9 de abril de 2013
MEC abre investigações em 13 estados para apurar fraudes em merenda escolar
Irregularidades são apuradas em metade do país; só este ano, MEC abriu 13 investigações
O GLOBO
Alunos na cidade de Balsas (MA) sem terem onde comer suas merendas, segundo relatório da CGU Divulgação/CGU
RIO — Licitações
fraudadas, comida estragada servida a alunos, escola fechada porque não
tem merenda. Pelo menos 13 estados no país investigam atualmente
denúncias de desvio de recursos para aquisição de merenda escolar, de
mau armazenamento de comida e de fornecimento insuficiente de alimentos
para escolas — em alguns casos, onde há denúncia de verba fraudada é
também onde falta merenda.
As irregularidades
estão sendo apuradas pelos Ministérios Públicos estaduais e Federal, e
por fiscalizações da Controladoria Geral da União, em estados como
Paraná, Rio Grande do Norte, Maranhão, São Paulo, Rio, Roraima, Minas,
Bahia e Pernambuco; na última semana veio à tona um caso no Espírito
Santo, com desperdício de merenda.
Fiscalizações da
CGU ilustram o descaso. Em Xexéu (PE), o órgão constatou em outubro de
2012 indícios de sobrepreço, aquisição de alimentos sem licitação ou
contratos de fornecimento. E faltou merenda em duas escolas por pelo
menos dois meses em 2012, após o recesso do meio do ano. Além disso, foi
encontrada carne mantida sem refrigeração. Numa das escolas, a merenda é
guardada onde morava a merendeira nos dias úteis. E “todas as escolas
visitadas não dispõem de água tratada ou filtrada para preparar a
merenda, utilizando-se água do poço”, diz a CGU.
Em São José do
Campestre (RN), em sete escolas com 75,6% dos alunos da rede municipal, a
CGU encontrou falta de merenda no fim de 2012. Cinco delas estavam
fechadas por causa disso.
Na última
sexta-feira, professores e alunos de três escolas confirmaram que a
merenda faltou no início deste ano, mas disseram que o serviço já foi
normalizado. Porém, numa quarta escola, rural, a Cícero Pinto de Souza, o
problema continua:
— Aqui sempre falta merenda. Este ano menos, mas tem faltado — contou o aluno do 4º ano José Rodrigo da Silva.
O depósito de
alimentos do município funciona numa sala improvisada na Secretaria de
Educação. Nessa mesma cidade, a CGU constatou em 2012 licitação
direcionada, com irregularidades como um pregoeiro nomeado após ter
assinado o edital. “Houve flagrante montagem para conferir aparência de
legalidade” a empresas que, diz a CGU, participaram de fraudes em outra
cidade do estado, Goianinha, com participação de um ex-prefeito.
Frango sem refrigeração
Já em Balsas (MA)
houve simulação de processos licitatórios em 2011 e 2012. Produtos como
frango abatido eram entregues por caminhões sem refrigeração, no
depósito central da cidade, “que não possui freezer”. Numa das escolas,
os alunos não tinham onde se sentar para comer.
Uma “simulação de
processo licitatório e conluio entre os licitantes, pregoeiro, equipe de
apoio, coordenadora da merenda escolar e presidente do CAE (Conselho de
Alimentação Escolar)” foi encontrada em Hidrolândia (CE) em 2012. Entre
os indícios, exigência de documento não previsto em lei, que seria dado
pela comissão de licitação; e o fato de um funcionário de licitante ser
ligado a outra. Enquanto isso, 40% das escolas visitadas sofriam com
atraso no fornecimento de comida aos alunos.
Atualmente, 780
municípios e seis estados — Acre, Amazonas, Maranhão, Pará, Rondônia e
Sergipe — até correm o risco de ficar sem recurso federal para merenda
porque o seu Conselho de Alimentação Escolar, órgão que monitora o uso
do recurso, está irregular, com mandato vencido. Estados e prefeituras
têm até o dia 30 para enviarem as prestações de contas das verbas
repassadas em 2011 e 2012.
Mas prestações de
2010, por exemplo, ainda têm problemas como documentação pendente — como
na Bahia, com pelo menos 60 cidades nessa situação. Só este ano, até
agora, já foram abertas pelo FNDE 13 tomadas de contas especiais
especificamente sobre problemas com verba para merenda.
O Ministério
Público também apura irregularidades. Em mais de cinco estados,
inquéritos foram abertos após investigação em São Paulo descobrir o que o
MP chamou de “máfia da merenda”: um grupo de empresas que simularia
licitações com ajuda de servidores públicos e secretários municipais. No
Nordeste, esse cartel teria usado uma empresa que dizia oferecer
serviços de “consultoria em políticas públicas” para intermediar a
relação entre as prefeituras e as empresas de alimentação.
Empresas
consideradas pelo MP como parte da máfia podem estar atuando sob outro
nome. Em Roraima, uma empresa apontada pelo MP-SP como sendo do grupo, a
J. Coan, forneceu merenda a escolas estaduais de Boa Vista de 2006 a
2011, período em que lá surgiram casos de leite servido azedo e sopa
servida com larvas. Em 2011, ela foi substituída pela Megaclear, que
mudou seu nome para Mega Foods. Para o MPF-RR, a empresa tem um endereço
que era o mesmo da Coan, além de telefones registrados em nome da Coan.
O MPF-RR destaca: “a Coan é sócia da Semper Foods, que, por sua vez, é
sócia da Mega Foods”. Integrante do Conselho de Alimentação Escolar, a
merendeira Silvinha Oliveira confirma que a Mega Foods é a fornecedora e
reclama da qualidade do produto:
— A comida às vezes chega atrasada, e os legumes que eles mandam já chegam estragados.
No Rio, segundo o
procurador da República Renato Machado, um inquérito apura indícios de
direcionamento de licitação em São João de Meriti envolvendo a Home
Bread; também há um inquérito no Supremo Tribunal Federal sobre suspeita
de superfaturamento em contratos da empresa.
Apontada pelo MP
como uma das principais do cartel que envolvia a Coan, a SP Alimentação
negou as acusações sobre o cartel e disse que a defesa está sendo feita à
Justiça. Responsáveis pela Coan não foram localizados até o fechamento
da edição. Um homem que quis se identificar apenas como Márcio e se
disse assessor da Home Bread negou as acusações, afirmando que as
licitações de que a empresa participou tiveram publicidade. (COLABOROU
Paulo Francisco, especial para O GLOBO)
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